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Falta de políticas efectivas pode gerar dependência das receitas advindas do sector extractivo em Moçambique

Fonte: Jornal O País – Plataforma Flutuante Coral-Sul FLNG

Sociedade Civil defende a criação de políticas que possam servir para acabar com a dependência das receitas geradas pelo sector extractivo, numa altura em que Moçambique encontra-se no auge da expansão significativa do interesse e investimento nas indústrias extractivas. Com a entrada da plataforma flutuante Coral-Sul FLNG, as expectativas de que as receitas futuras do sector extractivo iriam impulsionar a diversificação de base produtiva promovendo maior desenvolvimento económico aumentaram. Dezoitos anos depois, com a entrada da SASOL na província de Inhambane, a probalidade do projecto Coral-Sul gerar mudanças significativas e contribuir para a diversificação económica é bastante reduzida e não se verifica até hoje políticas efectivas  e o panorama económico recente não permite grandes esperanças de que isso venha a acontecer.

Para o Economista e Pesquisador do Centro de Integridade Pública, Rui Mate, a indústria extractiva pode dinamizar os restantes sectores económicos a curto e longo prazo, mas não se deve apenas centrar nesta indústria porque, qualquer choque que ocorra neste sector colocaria o resto da economia em perigo. Existe uma necessidade de se usar as receitas que este sector vai gerar e criar-se uma base diversificada de produção apostando numa indústria de processamento interno de matérias primas. “Neste momento são várias discussões que são feitas no sentido de começar a promover uma industrialização interna com base no sector extractivo, mas a prática mostra uma actuação contrária do governo, outro aspecto mostra pouco empenho do governo prendendo-se com a demora na aprovação de uma lei de conteúdo local cuja proposta foi submetida ao Conselho de Ministros em 2019”, refletiu Mate.

A elaboração e implementação de políticas efectivas e consistentes são necessárias e importantes para que o sector da indústria extractiva contribua para o crescimento económico e consequentemente a transformação económica estrutural, defende Yara Nova, Economista e Pesquisadora do Observatório do Meio Rural. “Deve-se ter em consideração que o sector da indústria extractiva em Moçambique, tem sua base principal, o envolvimento de bens e serviços cujos os efeitos a nível da economia local ou geral são de certa forma limitados. É necessário que se implementem programas e/ou políticas para canalizar receitas advindas deste sector para investimento de outros sectores que proporcionem efeitos multiplicadores e com capacidade de diversificar a economia”,  explicou Yara.

A abundância de recursos naturais constitui uma vantagem para os países, somente quando estes passam à fase de exploração e a sua exploração beneficia de forma directa o sector e a economia no geral, ressalta a Economista moçambicana, Leila Constatino. “Teoricamente, a exploração de recursos naturais, constitui um contributo positivo para o crescimento económico de Moçambique, mais do que contribuir para o crescimento económico, a exploração deve subsidiar o desenvolvimento económico do país, pois o foco do desenvolvimento não é só alargar a cadeia do impacto da exploração dessa potencialidade. A exploração vai somente concorrer para o desenvolvimento quando se garantir o efeito multiplicador do sector extractivo sobre outros sectores, para isso, é importante que se garanta uma ligação entre o sector extractivo e o resto da economia de forma directa”, salientou Leila.

Governo deve tomar em atenção os malefícios e benefícios do sector extractivo.

Leila Constatino reforça ainda que, os recursos naturais dependendo da forma como as políticas púbicas são direccionadas e implementadas podem ser um benefício ou malefício à economia e é importante se ter em conta as actuais pressões que as políticas de transição energética têm criado sobre o países, pois estas constiuem uma chamada de atenção à necessidade de se investir significativamente em outros sectores produtivos e menos voláteis às políticas externas, impulsionando igualmente o desenvolvimento do sector privado nacional, garantindo-se a diversificação económica e mecanismos eficientes de gestão das receitas e uma das principais é a operacionalização do Fundo Soberano.

Por outro lado Rui Mate sustenta que, alia-se a falta de interesse do governo, não só o pouco empenho com a demora na aprovação da lei do conteúdo local e sim a demora na aprovação de uma lei de fundo soberano que poderia garantir uma gestão transparente dos recursos garantindo benefícios intergeracionais. Mas, parece que o governo não se apercebe dos benefícios destes instrumentos para o desenvolvimento do país, optando pelo consumo presente de todos os recursos sem garantias de criação de bases de sustentabilidade para quando os recursos esgotarem.

Dimas Sinoa, Pesquisador do Centro para Democracia e Desenvolvimento, que falava na qualidade de orador do segundo webinar da série sobre “Indústria Extractiva, Governação Inclusiva e Transformação Económica Estrutural 2021”, deixou ficar que, embora a indústria extractiva tenha contribuído para um crescimento económico forte na última década, os investimentos da indústria extractiva não tiveram impacto desejado na redução da pobreza e na diversificação da economia. Sinoa acrescentou ainda que, o panorama económico mais recente não permite alimentar grandes expectativas de que isso venha acontecer futuramente, quando os projectos de gás natural da Bacia do Rovuma entrarem para a fase de produção.

 “De facto, com a entrada da plataforma flutuante FLNG em Moçambique criou e tem criado expectativas por parte dos moçambicanos”, frisou Fidália Maculuve, Gestora de Projectos do Instituto para Democrácia Multipartidária. O boom dos recursos naturais em qualquer sociedade gera enormes expectativas, quer no seio da população local ou do país em geral, como dos outros países na arena internacional, principalmente os que estão interessados no recurso descoberto num determinado país. Isto, faz perceber que a exploração dos recursos naturais tem impactos significativamente tangíveis em qualquer país, podendo ser positivos ou negativos, dependendo de como as instituições irão regular a exploração dos recursos naturais. Neste sentido, os países que detém grandes quantidades de recursos naturais têm aprovado políticas que podem trazer o máximo de benefícios ao longo de toda a cadeia de valor da exploração destes recursos para o país no geral e particularmente para os cidadãos.

Há necessidade de se definir políticas claras para gestão das receitas do sector  extractivo.

Para Fidália Maculuve, há necessidade de definir políticas claras sobre como se pretende fazer a gestão das receitas provenientes do sector da indústria extractiva, como forma de maximizar de forma racional os benefícios que o país tem em termos de potencial energético. Tendo em consideração que o sector da indústria extractiva é volátil e os seus recursos são esgotáveis, bem como, pelo desafio que a mudança climática tem nos colocado a não definição de políticas claras constitui um risco para o país, pelos seguintes factores:

  1. Instabilidade macroeconômica e fiscal – sem a definição de políticas claras corre-se o risco de estar-se numa situação de volatilidade macroeconómica e fiscal devido a dependência de recursos naturais para prosperidade económica e receita do governo. Não há nenhuma segurança acautelada para períodos de choques imprevistos que atingem economias dependentes de recursos.
  2. Fraco desenvolvimento doméstico em termos de infraestrutura e fraca diversificação da economia: pouco investimento será feito para o desenvolvimento de infraestruturas robustas como parte dos benefícios, potencial energético que o país possui. Marginalização dos outros sectores da economia, visto que o sector extrativo é o que mais contribui em termos de receitas.
  3. Doença holandesa: por ser um sector volátil cujos recursos são finitos, há o risco de toda a economia do país depender das receitas da indústria extractiva para o Estado realizar seus gastos públicos e em tempos de oscilação de preços no mercado internacional pode afectar a economia interna;
  4. Desperdício, corrupção e investimentos públicos pobres: a falta de políticas claras e pode contribuir para a não transparência dos processos ao longo de toda a cadeia de valor da indústria extractiva e a corrupção; pode contribuir para a falta de transparência na gestão das receitas canalizadas para o cofre do Estado, sendo difícil fazer o devido acampamento; pode levar o governo a fazer gastos e dividas publicas, na esperança de que terá ganhos futuros com as receitas. Existem muitas evidências mostrando que a qualidade do investimento público se deteriora durante períodos de aumentos acentuados na receita pública.

De referir que a definição de políticas claras pode ser uma saída racional para uma melhor racionalização de recursos, para além de garantir a boa governação e gestão transparente dos recursos do sector. É imprescíndivel a criação de ligação directa do sector com os outros sectores produtivos da economia moçambicana de forma que se garantam mecanismos de crescimento  económico acompanhado de mudanças estruturais com o impacto directo e positivo no bem-estar e satisfação das necessidades da população moçambicana. A criação de um Fundo Soberano e a aprovação da Lei do Conteúdo Local por exemplo, com enfoque nos recursos naturais são importantes para os países que possuem abundância destes recursos, o que denota uma certa maturidade de gestão económica advinda dos recursos e da resistência à ganância dos seus dirigentes em criar dívidas, motivados pelas expectativas de ganhos futuros.

Escrito por: Sénia Vilanculos, Jornalista-estagiária do Mídia Lab

Ernesto Timbe

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